Passagem escolhida: Jó 42.1-17 com 1.8 e com 2.10
1.
Autoria
do livro
Vemos que a história de Jó já era conhecida na época do
profeta Ezequiel (Ez 14.14,20), contudo, não se pode afirmar que o livro já
estivesse escrito. É possível que Ezequiel conhecesse apenas a tradição oral.
É bom observar, como nos alerta Elissen (2001), que o
livro é anônimo, não dando pistas sobre o autor. Contudo o autor traz a mesma lista
de nomes de outros autores, como Heavenor (1997, p. 701) e Gagliardi
(1991). Vemos que os nomes mais indicados de possíveis autores são Jó, Eliú (Jó
32.6), Jeremias, Moisés e Salomão, sendo estes dois os mais aceitos. Surgem
ainda nomes como Isaías e Baruque (amigo de Jeremias)
Ao que parece, o nome do livro, como Ester e Rute, se refire
apenas ao personagem principal, não a seu autor.
Os que defendem a autoria de Moisés se baseiam no talmud judaico, que afirma que Moisés
teria ouvido a história quando habitava em Midiã, conforme assevera, Gagliardi.
Para Heavenor, o livro é da autoria de um judeu que, não obstante a sua
lealdade ao judaísmo, se recusa a se deixar levar por certos aspectos do credo
popular, em particular, pela tradicional visão de sofrimento como retribuição
pelo pecado. É possível a autoria mosaica, pois há escritos do mesmo período, de
outros povos, com história e estilo semelhantes.
Gagliardi salienta que um dos motivos de muitos defender
a autoria salomônica se deve ao estilo e conteúdo parecido com Eclesiastes.
Lasor, Hubbard & Bush (1999) destaca que alguns ligam a
história de Jó com a morte de Josías, registrada em 2 Rs 23.29ss, que morreu
tragicamente mesmo após a grande reforma efetuada no reino. Portanto, alguém do
período teria escrito. Lasor ainda enfatiza que, apesar de ser anônimo, o autor
deve ter tido experiência semelhante, provando do sofrimento e tendo encontro
com Deus. Também era alguém bastante hábil em escritos sapienciais.
2.
Data
de escrita
A data de escrita só é possível de afirmar determinando o
escritor, o que vimos que é bastante polêmico. Gagliardi (1991) confirma isso,
lembrando que, por não sabermos o autor, não temos como saber a data de
escrita. Se crermos que tenha sido Eliú ou o próprio Jó,, dataremos por volta
do século XXII a.c.; se foi Moisés, então datáramos por volta de de 1450 a.c.;
se Salomão, em cerca de 950 a.c.
Quanto ao período da história registrada no livro, a
maioria dos consideram que o fato foi real e que deve se encaixar no período
patriarcal. Para isso, conforme nos mostra Kaiser (2007, pg. 101), temos que: 1.
As riquezas de Jó são contadas em rebanhos (Jó 1.3); 2. Jó é o sacerdote
familiar que oferece sacrifícios (Jó 1.5;42.8); 3. A moeda corrente (qesftâh
— Jó 42.11) é a mesma que se menciona nos tempos de Jacó (Gn 33.19; cf, Js 24.32);
4. A longevidade de Jó (Jó 42.16) semelhante
á de José (Gn 50.23); e 5. A morte de Jó (42.17) é descrita como a de
Abraão (Gn 25.8) e a de Isaque (35.29).
Elissen (2001) defende ou princípio do século XV (Moisés)
ou meados do século X (Salomão). Já Lasor et al. (1997) lembra que se aqueles
que conectam a escrita do livro à morte de Josías, datam por volta de (609
a.c.).
Muitos Alegam que a idéia contida em Jó é muito avançada,
mesmo para a era salomônica, e muito mais para a era patriarcal. Contudo, é
mais provável que tenha sido realmente escrito ou na época de Moisés ou de
Salomão. Não se pode desprezar a escrita na época do exílio babilônico, embora
os autores pesquisados não tenham feito referência à possibilidade desse
período.
3.
Para
quem foi escrito
Certamente o livro foi escrito para judeus, o problema é
de que época. Como vimos até aqui, não se pode dizer quando exatamente foi
escrito, por isso, o contexto muda.
Se escrito por Moisés, pode ter servido para contar ao
povo sofredor de Israel, que acabara de sair da escravidão e que agora sofria
no deserto, que o sofrimento não era em vão. Então a história que Moisés teria
ouvido em Midiã serviria de exemplo para eles.
Caso tenha sido escrito no tempo de Salomão, falaria a
uma sociedade que em grande parte estava afeita à literatura de sabedoria e,
portanto, serviria como argumentação acerca da observação do mal, especialmente
sobre o justo.
Se escrito no contexto do rei Josias, falava a um povo
que, diante de um bom rei que morrera, tinha confrontada sua crença popular de
castigo e recompensa divina. Ou ainda, se no período do exílio babilônico,
teria como destinatários um povo que estava sofrendo e precisava de esperança.
Embora tenha tido público definido, não podemos negar
que, por seu caráter universal de conteúdo, a saber, o problema do sofrimento
dos justos, é um livro que fala a cada um dos que, como Jó, buscam a Deus e
procuram se afastar do mal, contudo, sofrem.
4.
Finalidade
de escrita do livro
Para Heavenor (1997), a questão magna do
livro de Jó resume-se nestas palavras: "Por que será que o inocente sofre
tanto?" É posta uma resposta de que o sofrimento é retribuição de Deus
pelos pecados do homem. Esse parece ser um princípio inflexível da existência.
Contudo, aparece a figura de Eliú, que se opõe a essa mensagem, tratando-o como
disciplina, cuja finalidade é purificar, e não castigar. Após isto Jó vai à
presença de Deus e conforma-se com a Sua divina vontade.
Heavenor ainda afirma que o livro denuncia a
insuficiência da mente humana para uma compreensão adequada do problema do
sofrimento. A visão acerca dos sofrimentos de Jó muda de uma prova de castigo
divino, como pretendiam os amigos, para uma prova de confiança divina no seu
caráter.
Gagliardi destaca que muitos defendem que Jó
seria um personagem fictício criado para fins de lição moral e espiritual (cf. Ez
14.14; Tg 5.11). Independentemente da historicidade dos fatos relatados no
livro de Jó, sem sombra de dúvidas o livro tem um propósito de ensinar, não
apenas contar uma história ou estória. Por isso Gagliardi dia que o livro mostra
as diferentes interpretações existentes para a questão do sofrimento humano,
especialmente do justo. Vemos a perspectiva satânica, do piedoso sofredor, de
seus amigos de fora do problema, e a de Deus. Satanás diz que Jó só teme a Deus
por que é rico, se deixar de ser não buscará mais a Deus. Os amigos de Jó defendem
que, se ele sofre, é porque está em pecado e que a prosperidade era recompensa
certa do justo; Eliú destaca os fins disciplinares o sofrimento; para Jó: o
sofrimento é para o ímpio, não para o justo; Deus afirma ser privilégio dado
para nos aperfeiçoar e capacitar a cumprir seu propósito.
Já Elissen (2001), afirma que o objetivo
central do livro é mostrar que Deus geralmente usa a adversidade, bem como a
prosperidade, para amadurecer o seu povo. Deus se relaciona com seu povo não
com regras mecânicas e legalistas, com mérito e demérito humano, mas com
misericórdia, graça e amor.
Por sua vez, LASOR et al. (1997), como
destacamos anteriormente, lembra que alguns conectam a história com a morte do
rei Josías (2 Rs 23.29ss). Dado o trágico falecimento desse rei pouco depois da
reforma feita, causou um choque na pessoas, devido à sua crença de castigo e
recompensa. A história, fosse considerada verídica ou apenas uma analogia,
visaria mostrar que essa lógica é equivocada.
O universo demonstra a capacidade de Deus de
guiar todas as coisas, mesmo as que não compreendemos, como o sofrimento. Tudo
deve nos conduzir à adoração a Deus. A grandiosidade dEle nos leva a adorá-lO
independentemente do que poderemos ganhar, aliás, poderemos ganhar sofrimento.
Deus tem um propósito muito maior que nos dar uma vida confortável, Ele quer
nos aperfeiçoar visando a eternidade. Os filhos de Deus buscam a Deus, não de
Deus, por isso, aceitam o sofrimento.
5.
Gênero
literário principal do livro e sua relação com a correta forma de interpretá-lo
Zuck (1994) classifica o livro de Jó
como literatura sapiencial reflexiva e afirma que essa literatura “compreende
uma discussão sobre os mistérios da vida”. (ano, pg. 153). Na mesma linha, Fee & Stuart (1997) destaca
que “a sabedoria especulativa é prática e empírica ao invés de meramente
teórica” (pg. 200). Diz que esse tipo de literatura é mais fácil de absolver e
guardar na memória. Afirma ainda que “sabedoria é a disciplina de aplicar a
verdade à vida” (ano XX, pg 197) e que o sábio age de acordo com a verdade: “O
sábio procurava ser bem sucedido em tudo que fazia”, para isso “qualquer pessoa
que procura diariamente aplicar a verdade de Deus e aprender da sua experiência
pode acabar ficando sábia” (pg. 198-199).
Gagliardi o clássica como livro
“poético”. Esse termo não é atribuído por se tratar de um romance, uma estória
imaginária, mas devido a sua forma literária, seu estilo elegante e da forma
poética.
Dos autores pesquisados, Lasor et al.
(1997) é o que se detém mais sobre a temática do gênero do livro. Ele assevera
que Jó, provérbios e salmos são uma literatura instrutiva, que ensina o
indivíduo a como cumprir a lei do Senhor em seu dia a dia. Ele não define o
gênero em que consiste o livro de Jó, mas considera é um escrito sapiencial que
mescla épico, comédia (ironia), lamentação, disputas argumentativas e ensino.
Lasor explica que há dois tipos de
escritos sapienciais, a sabedoria proverbial, que é composta de ditos breves e
substanciais, e a sabedoria especulativa ou contemplativa, que consiste em
monólogos, diálogos ou ensaios que discorrem sobre problemas da existência
humana. Essa abordagem especulativa é a encontrada no livro de Jó. Não é uma
especulação teórica, mas extremamente prática, tratando de problemas concretos
(1997, pg. 520-521).
Quanto à forma da mensagem, Lasor
entende que ela e mensagem estão ligadas na poesia. Usa-se uma imagem verbal
para transmitir o significado. Segundo ele, devemos analisar a passagem, ou
seja, dividir as partes, contudo, não devemos fragmentar a mensagem; devemos ainda
observar as figuras de linguagem deste tipo de literatura, como montes que
saltam, ou seja, cuidado com a interpretação literal.
Lasor destaca ainda que a sabedoria no
Oriente antigo e no AT visava o êxito e o bem estar do indivíduo. Para o
verdadeiro israelita, toda sabedoria provinha de Deus e só aquele que temia a
Deus poderia começar a ser sábio. A sabedoria baseada na capacidade humana sem
temer e obedecer a Deus estava destinada ao fracasso.
F. F. Bruce (1997) acredita que o reconhecimento
das formas básicas da poesia bíblica nos ajuda a interpretar melhor o texto, “O
entendimento da métrica bíblica nos ajuda a compreender melhor o texto das
Escrituras”. (ano, pg. 68). Ele lembra que a verdadeira sabedoria para os
pensadores hebreus, não era unicamente um raciocínio intelectual, mas acima de
tudo prático. Sendo o "temor do Senhor o princípio da sabedoria", o
verdadeiro sábio era aquele que encarava a vida num espírito de reverência a
Deus.
Esse tipo de literatura tenta entender
problemas reais como o sofrimento do justo, por isso, devemos ter cuidado,
pois, como podemos ver no livro de Jó, os conselhos de três de seus amigos são
errados e constituem o pensamento popular. Por sua vez, o discurso de Eliú,
embora verdadeiro, não se constitui de toda a verdade. Deve-se ver toda a
mensagem para não correr o risco de chegar à interpretações equivocadas.
Kaiser (2007) diz que o temor era um
princípio orientador para todos os aspectos da vida e "todos os dias que
na terra viverem" (2007, pg. 173), inclusive quanto ao sofrimento. Quando
os homens estavam em relacionamento correto com Deus, então seu relacionamento
era apropriado para entenderem os objetos e o próprio mundo. Pg 174.
Portanto, a literatura poética
especulativa deve ser entendida a fim de que se possa interpretar corretamente
o texto. Tanto se deve compreender isso por causa da linguagem emprega, como
figuras de linguagem, que não se podem interpretar corretamente, quanto ao
objetivo e conteúdo, pois se trata de um livro de sabedoria, que visa discorrer
um problema real, neste caso, o sofrimento do justo.
6.
Interpretação
da passagem
É o próprio Deus quem testifica da
justiça de Jó: “Disse então o SENHOR a Satanás: ‘Reparou em meu servo Jó? Não
há ninguém na terra como ele, irrepreensível, íntegro, homem que teme a Deus e
evita o mal’” (Jó 1.8). Contudo, na visão de Satanás, os bens materiais e a paz
familiar que rodeiam Jó são o verdadeiro motivo de toa a piedade demonstrada
Jó. Para Satanás, se Deus destituísse Jó de seus bens e filhos, bem como de sua
saúde, ele certamente deixaria de ser justo.
Contudo, vemos durante todo o livro que
Jó nega as duas coisas: Deus não o poderia estar castigando, pois ele era justo
(Jó 31), assim também ele
demonstra desde início que seu temor à Deus não depende das circunstâncias:
“Ele respondeu: Você fala como uma insensata. Aceitaremos o bem dado por Deus,
e não o mal? Em tudo isso Jó não pecou com seus lábios” (Jó 2.10). Vale
destacar que, embora não aceite que mereça sofrimento, Jó identifica a origem
de seu sofrimento em Deus, tanto quanto de seus bens.
Depois de toda a sua experiência,
especialmente depois do discurso de Deus a Jó, do capítulo 38 (trinta e oito)
ao 41 (quarenta e um), a auto-justiça de Jó cai por terra e Ele reconhece que
Deus é soberano: “Sei que podes fazer todas as coisas; nenhum dos teus planos
pode ser frustrado” (Jó 42.2). Reconhece que não é capaz sequer de entender as
coisas mais simples da criação, quanto mais algo tão complexo: “Tu perguntaste:
‘Quem é esse que obscurece o meu conselho sem conhecimento?’ Certo é que falei
de coisas que eu não entendia, coisas tão maravilhosas que eu não poderia
saber” (Jó 42.3).
Ainda vemos que Jó reconhece a imensa
sabedoria de Deus, que sabe conduzir toda sua criação com perfeição, mesmo
quanto as coisas que não compreendemos, como o sofrimento: “Tu disseste: ‘Agora
escute, e eu falarei; vou fazer-lhe perguntas, e você me responderá’” (Jó
42.4). Depois do discurso de Deus e de
sua experiência Jó podia dizer “Meus ouvidos já tinham ouvido a teu respeito,
mas agora os meus olhos te viram” (Jó 42.5). Essa visão mais clara de Deus o
faz entender quão pequeno e indigno ele era diante do criador: “Por isso
menosprezo a mim mesmo e me arrependo no pó e na cinza” (Jó 42.6), tal qual
Isaías (Is 6.1-8).
Jó se curva diante da soberana vontade
de Deus e recebe, das suas mãos, tanto a dádiva como a privação. O livro nos
ensinar a suportar e aceitar o sofrimento como algo vindo de Deus com bom
propósito, mesmo que não possamos compreender.
7.
Relação
da passagem com o Novo testamento
Não podemos deixar de notar que as
verdades expressas no livro de Jó podem ser vistas no Novo Testamento.
Podemos ver Pedro em sua primeira carta
afirmando: “Nisso vocês exultam, ainda que agora, por um pouco de tempo, devam
ser entristecidos por todo tipo de provação” (1 Pe 1.6). Embora desfrutemos de
toda sorte de bênçãos espirituais (Ef 1.3), passaremos por muitas aflições,
conforme o próprio Jesus afirmou (Jo 16.33). Pedro ainda afirma que viver uma
vida digna do Senhor nos traz sofrimento, mas fomos chamados para isso, como o
próprio Jesus sofreu (1 Pe 2.19-24). Afirma que “É melhor sofrer por fazer o
bem, se for da vontade de Deus, do que por fazer o mal” (1 Pe 3.17). Jesus
também sofreu ao fazer a vontade de Deus (1 Pe 3.18; 4.1). Assim como Jó,
devemos viver nos afastando do mal e temendo a Deus, sendo retos em todo nosso
proceder (1 Pe 4.2). Servir a Deus não nos exime de passar por sofrimento (1 Pe
4.14,16), inclusive, sofremos como correção de Deus (1 Pe 4.17-19), serve para
provar e aperfeiçoar nossa fé (1 Pe 1.7).
Tiago também lembra que não podemos
prever o futuro, mas devemos confiar em Deus, independente do que esteja para
vir ou já estejamos passando (Tg 4.13-16). Tal qual como Jó, devemos busca uma
conduta justa em todo nosso proceder (Tg 2.202-6). Tiago alerta que devemos nos
alegrar diante das provações, porque são como uma prova, um teste de nossa fé e
ela traz maturidade (Tg 1.2-4,21-25). Ele nos lembra que há recompensa para
aquele que persevera, embora não fale de coisas materiais, mas muito mais
excelentes (Tg 1.12). Diante da tribulação, Tiago nos diz o que fazer (Tg
5.7-11): ser pacientes, fortalecer o coração, não reclamar, lembrar dos
exemplos dos homens de Deus (cf. Hb 11), lembrar que Deus é cheio de compaixão
e misericórdia, lembrar que o fim prometido aos santos do Senhor é muito mais
superior comparado ao que passamos hoje (Rm 8.18). Ele nos lembra de Jó (única
citação do Novo Testamento acerca desse personagem): “Vocês ouviram falar sobre
a perseverança de Jó e viram o fim que o Senhor lhe proporcionou” (Tg 5.11b).
Também vemos precedentes no Novo
Testamento da visão do sofrimento como retribuição divina. Ao verem um cego “os
discípulos de Jesus perguntaram: ‘Rabi, quem pecou, este ou seus pais, para que
nascesse cego?’ Disse Jesus: ‘Nem ele nem seus pais pecaram, mas isto aconteceu
para que a obra de Deus se manifestasse na vida dele’” (Jo 9.2,3). Jesus,
portanto, desfaz essa lógica humano, nos dizendo que o sofrimento também é
instrumento utilizado por Deus para agir com bons propósitos para os homens,
mesmo que nossa mente não consiga alcançar tão grande mistério.
Jesus também diz que o servo não tem
direito algum e o senhor (aqui fala de Deus, ou melhor, do próprio Cristo) não
obrigação de agradecer ou retribuir pelo serviço do servo (Lc 17.7-10).
Aflições são um bem presente também na
vida e ensino de Paulo. Quanto a elas não comentarei, pois falam por si mesmas.
Vejamos alguns exemplos:
“Pois
como as aflições de Cristo transbordam para conosco, assim também a nossa
consolação transborda por meio de Cristo. Se somos atribulados, é para vossa
consolação e salvação; se somos consolados, para vossa consolação é, a qual se
opera suportando com paciência as mesmas aflições que nós também padecemos. A
nossa esperança acerca de vós é firme, sabendo que, como sois participantes das
aflições, assim o sereis também da consolação”. (2
Co 1.5-7)
“Agora
me regozijo no que padeço por vós, e na minha carne cumpro o resto das aflições
de Cristo, pelo seu corpo, que é a igreja”. (Cl 1.24)
“De
maneira que nós mesmos nos gloriamos de vós nas igrejas de Deus por causa da
vossa paciência e fé, e em todas as vossas perseguições e aflições que
suportais”. (2 Ts 1.4)
“Sofre,
pois, comigo, as aflições como bom soldado de Cristo Jesus”. (2
Tm 2.3)
O que dizer do sofrimento de Jesus? O Novo Testamento
inteiro esta recheado desse conteúdo como em Hb 2.10: “Convinha que aquele,
para quem são todas as coisas, e mediante quem tudo existe, trazendo muitos
filhos à glória, consagrasse pelas aflições o autor da salvação deles”. Cristo
tinha que padecer. “O discípulo não é mais do que o mestre, nem o servo mais do
que o seu senhor (Mt 10.24).
Embora Jesus fosse Deus, o autor de Hebreus nos diz que
“embora sendo Filho, aprendeu a obediência por meio daquilo que sofreu” (Hb
5.8). O sofrimento tem fins didáticos da parte de Deus. A atitude de Jesus
diante deles foi só uma: “Seja feita a Tua vontade!”: Podemos ver:
“Venha
o teu reino, seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu”.
(Mt 6.10)
“Indo
segunda vez, orou, dizendo: Meu Pai, se este cálice não pode passar de mim sem
que eu o beba, faça-se a tua vontade”. (Mt 26.42)
“Seja feita a Tua vontade’ poderiam ser palavras
de Jó.
8.
Aplicação
pessoal
Jó, embora fosse justo, tendo como
testemunha disso o próprio Deus, reconheceu, por fim, que, diante de Deus nossa
justiça se desfaz (Is 64.6). Ante Deus todos nos deparamos verdadeiramente como
somos, desprezíveis pecadores (Is 6). Jó proclama sua auto-justiça, seu orgulho
por ser reto (Jó 31), mas depois de ver Deus, reconhece sua pequenez (Jó
42.5-6). Devemos ver quão pequenos somos.
Outra
coisa a retratar é que, se Jó não é tão justo como parece, pois, embora em
relação aos seus pecados externos, visíveis, ele fosso inimputável, seu pecados
do espírito (orgulho e auto-justiça) o condenavam. Paulo diz: “Amados, visto
que temos essas promessas, purifiquemo-nos de tudo o que contamina o corpo a e
o espírito, aperfeiçoando a santidade no temor de Deus” (2 Co 7.1).
Se
Jó não é totalmente justo, visto que se prova que ele tinha pecados, e levando
o pecado à morte (Rm 6.23), Jó precisa de outro tipo de justiça. Daí nos afirma
o apóstolo Paulo a solução providenciado pelo próprio Deus: “sendo justificados
gratuitamente por sua graça, por meio da redenção que há em Cristo Jesus” (Rm
3.24). “Tendo sido, pois, justificados pela fé, temos paz com Deus, por nosso
Senhor Jesus Cristo” (Rm 5.1). “Como agora fomos justificados por seu sangue,
muito mais ainda, por meio dele, seremos salvos da ira de Deus!” (Rm 5.9).
Paulo
afirma ainda de forma mais categórica em Gl 2.16:
“sabemos que ninguém é justificado pela
prática da Lei, mas mediante a fé em Jesus Cristo. Assim, nós também cremos em
Cristo Jesus para sermos justificados pela fé em Cristo, e não pela prática da
Lei, porque pela prática da Lei ninguém será justificado”.
Não podemos exigir nada de Deus. O que
Deus concede se deve à sua bondade, não a nosso merecimento.
Não podemos justificar o sofrimento como
algo proveniente do Diabo, mas é algo vindo de Deus, de alguma forma, visando
nosso bem. Não existe sequer uma referência bíblica que nos diga que devemos
ofertar, jejuar ou orar para acabar com o sofrimento. A ordem é apenas para
suportarmos, nos alegrar e confiar em Deus.
Os caminhos de Deus são muito mais altos
que os nossos (Jó 11.8), Ele permite o sofrimento, mas sabe o que faz. Devemos
confiar em Sua sabedoria e justiça, pois ele sabe como guiar as coisas com
perfeição.
Não conseguiremos entender todas as
coisas, a razão é limitada. Há coisas em que apenas precisamos confiar. Por
vezes Deus nos inflige sofrimento exatamente para provar e aperfeiçoar essa
confiança. C. S. Lewis (2006) teve experiência de sofrimento e sobre confiança
em Deus em meio à dor, como vemos:
“E
fácil dizer que você acredita que uma corda seja forte e segura, enquanto a
está usando apenas para amarrar uma caixa; mas imagine que deva dependurar-se
nessa corda sobre um precipício. Será que não iria primeiro descobrir o quanto
na verdade confia nela?”. (Pg 45)
“Descobri
que não havia coisa semelhante. Apenas um perigo verdadeiro põe à prova a realidade
de uma crença”. (pg.47)
“Achei
que havia confiado na corda até que se tornou importante saber se ela
suportaria o meu peso. Agora que isso importa percebo que não confiava nela”. (Pg.
59)
A revelação de Deus promove a submissão,
a fé e a coragem. O Deus que se apresenta a Jó não responde a nenhuma das
questões debatidas em todo o livro; mas satisfaz a necessidade do coração de
Jó.
Leva-nos a confiar em Deus em quaisquer
circunstância, depender de Deus e ver que Ele é tudo que precisamos.
Há realidade desfaz o pensamento de
retribuição divina. Vemos os Salmos 37 e 73, bem como o autor de Eclesiastes
essa verdade. há justos que sofrem e são prósperos enquanto há ímpios prósperos
e felizes.
Deus nos conhece e não coloca em nossa
vida aflição que não possamos suportar (1 Co 10.13). Quando nossas forças não
são suficientes, nos fortalecemos na fora de Seus poder (2 Co 1.8; Ef 1.19;
6.10).
Apesar do pecado de Jó, que fica
evidenciado no livro (Jó 32.2), Deus continua chamando Jó de “meu servo”, como
no início da história (Jó 42.7). Deus não faz vistas grossas aos nossos
pecados, mas nos ama e valoriza apesar dEle. Vemos que, por causa de Cristo Ele
nos aceita e busca nosso bem. Ele demonstrou Seu imensurável amor se tornando
homem e morrendo na cruz (Jo 3.16; Fp 2.5-11).
Deus autoriza a ação de Satanás,
determina até onde ele pode ir, não diz a Jó o que está acontecendo nem explica
no final porque fez. Não responde as perguntas de Jó. Os plano ou propósitos de
Deus não podem ser impedidos, devemos confiar Jó 42.2. A revelação de Deus
desfaz a autojustiça de Jó.
Satanás existe e é um ser pessoal (anjo
caído), que se opõe a Deus. Sua oposição a Deus. Não podendo atingir Deus ele
direciona sua ira contra os santos do Senhor, buscando seduzi-los e/ou destruí-los
(cf. Ap 12). Contudo está subordinado a Deus e só faz o que lhe é permitido
fazer. Ele não pode tocar os filhos de Deus sem que Este permita e até onde é
autorizado.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
GAGLIARDI JR., Ângelo. Panorama do Velho Testamento. Rio de Janeiro: Vinde Comunicações,
1995.
ELISSEN, Stanley A. Conheça
melhor o Antigo Testamento. Trad. Emma Anders de Souza Lima. São Paulo:
Vida, 1991.
LaSOR, William Sanford; HUBBARD, David Alan & BUSH,
Frederic W. Introdução ao Antigo Testamento. Trad. Lucy Yamakami. São
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KAISER JR. Walter C. Teologia
do Antigo Testamento. Trad. Gordon Chown. 2. Ed. São Paulo: Vida Nova,
2007.
DAVIDSON, Francis (org.). O novo comentário da Bíblia. 3. Ed. São Paulo: Vida Nova, 1997.
FEE, Gordon D, & STUART, Douglas. Entendes
o que lês?. 2. Ed. São Paulo:
Vida Nova, 1997.
ZUCK, Roy B. Interpretação
Bíblica: meios de descobrir a verdade
bíblica. Trad. Cesar de F. A. Bueno Vieira. São Paulo: Vida Nova, 1994.
LEWIS, C. S. A anatomia de uma dor: um
luto em observação. Trad. Alípio Franca Correia Neto. São Paulo: Editora
Vida, 2006.